quarta-feira, 15 de maio de 2024

ENTREVISTA COM O PRESIDENTE DO SINDMAEB - SERGIO COUTO - RADIO PORTO BRA...

Ministro Dias Toffoli nega pedido de prisão de Alexandre de Moraes

 Protocolada pela família do empresário Cleriston da Cunha, conhecido como "Clezão", que morreu no presídio da Papuda, a queixa-crime assinada pelo advogado Tiago Pavinatto acusava Moraes de abuso de autoridade, maus-tratos, tortura e prevaricação, com penas que poderiam chegar a 31 anos de prisão.


O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, negou seguimento a uma representação que pedia a prisão de Alexandre de Moraes.

Protocolada pela família do empresário Cleriston da Cunha, conhecido como “Clezão”, que morreu no presídio da Papuda, a queixa-crime assinada pelo advogado Tiago Pavinatto acusava Moraes de abuso de autoridade, maus-tratos, tortura e prevaricação, com penas que poderiam chegar a 31 anos de prisão.

Cleriston foi detido durante os eventos de 8 de janeiro e morreu aos 46 anos na Papuda, em novembro de 2023, após passar mal. A família destacou que a Procuradoria-Geral da República havia emitido um parecer favorável à sua soltura dois meses antes de sua morte, além de laudos médicos que indicavam problemas de saúde. No entanto, a manifestação da PGR não foi apreciada por Moraes, relator da ação dos atos antidemocráticos.

A queixa-crime acusava Moraes de “omissão dolosa”. Ao analisar o caso, Toffoli argumentou:

“O juízo hipotético que se realiza (se A tivesse acontecido, então B não teria acontecido) deve ser rigoroso, sob pena de se incorrer responsabilização criminal a partir de nexo causal especulativo. Ora, mesmo que tivesse sido apreciado o pedido de liberdade provisória, (1) não necessariamente teria sido revogada ou concedida a prisão domiciliar e, ainda, (2) não necessariamente teria sido evitado o falecimento de Cleriston.”

Outro ponto abordado por Pavinatto foi a falta de reavaliação da prisão de Cleriston após 90 dias, conforme determina o Código de Processo Penal (CPP). Sobre isso, Toffoli afirmou:

“Quanto à alegação de que a prisão não teria sido reavaliada no prazo de 90 dias, o Plenário desta Corte, nos autos do Suspensão de Liminar 1.395, firmou entendimento no sentido de que a falta de reavaliação da prisão preventiva, a cada 90 dias, nos termos do artigo 316, parágrafo único, do CPP, não gera direito à revogação automática da prisão preventiva.”

Toffoli concluiu que a petição contra Moraes era “amparada unicamente em ilações e acusações infundadas, com breves intersecções com a realidade e despida de fundamentação jurídica correlata aos fatos e provas”, classificando a representação como “panfletária”.

Fonte: Agência Brasil


quinta-feira, 2 de maio de 2024

Qual era a real aparência de Jesus, segundo historiadores

 Um homem branco, barbudo, de longos cabelos castanhos claros e olhos azuis. Essa é a imagem mais conhecida de Jesus Cristo, adotada o longo de séculos e séculos de eurocentrismo — tanto na arte quanto na religião.

Apesar de ser um retrato já conhecido pela maior parte dos cerca de 2 bilhões de cristãos no mundo, essa é uma construção que pouco deve ter tido a ver com a realidade.

O Jesus histórico, apontam especialistas, muito provavelmente era moreno, baixinho e mantinha os cabelos aparados, como os outros judeus de sua época.

A dificuldade para saber como era a aparência de Jesus vem da própria base do cristianismo: a Bíblia, conjunto de livros sagrados cujo Novo Testamento narra a vida de Jesus — e os primeiros desdobramentos de sua doutrina — não faz qualquer menção que indique como ele era fisicamente.

"Nos evangelhos ele não é descrito fisicamente. Nem se era alto ou baixo, bem-apessoado ou forte. A única coisa que se diz é sua idade aproximada, cerca de 30 anos", comenta a historiadora neozelandesa Joan E. Taylor, autora do livro What Did Jesus Look Like? (Qual era a aparência de Jesus, em tradução livree professora do Departamento de Teologia e Estudos Religiosos do King's College de Londres.

"Essa ausência de dados é muito significativa. Parece indicar que os primeiros seguidores de Jesus não se preocupavam com tal informação. Que para eles era mais importante registrar as ideias e os papos desse cara do que dizer como ele era fisicamente", afirma o historiador André Leonardo Chevitarese, professor do Instituto de História da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e autor do livro Jesus Histórico - Uma Brevíssima Introdução.

Em 2001, para um documentário produzido pela BBC, o especialista forense em reconstruções faciais britânico Richard Neave utilizou conhecimentos científicos para chegar a uma imagem que pode ser considerada próxima da realidade.

A partir de três crânios do século 1, de antigos habitantes da mesma região onde Jesus teria vivido, ele e sua equipe recriaram, utilizando modelagem 3D, como seria um rosto típico que pode muito bem ter sido o de Jesus.



Esqueletos de judeus dessa época mostram que a altura média era de 1,60 m e que a grande maioria deles pesava pouco mais de 50 quilos. A cor da pele é uma estimativa.

Taylor chegou a conclusões semelhantes sobre a fisionomia de Jesus.

"Os judeus da época eram biologicamente semelhantes aos judeus iraquianos de hoje em dia. Assim, acredito que ele tinha cabelos de castanho-escuros a pretos, olhos castanhos, pele morena. Um homem típico do Oriente Médio", afirma.

"Certamente ele era moreno, considerando a tez de pessoas daquela região e, principalmente, analisando a fisionomia de homens do deserto, gente que vive sob o sol intenso", comenta o designer gráfico brasileiro Cícero Moraes, especialista em reconstituição facial forense com trabalhos realizados para universidades estrangeiras.

Moraes já fez reconstituição facial de 11 santos católicos - e criou uma imagem científica de Jesus Cristo a pedido da reportagem.

"O melhor caminho para imaginar a face de Jesus seria olhar para algum beduíno daquelas terras desérticas, andarilho nômade daquelas terras castigadas pelo sol inclemente", diz o teólogo Pedro Lima Vasconcellos, professor da Universidade Federal de Alagoas e autor do livro O Código da Vinci e o Cristianismo dos Primeiros Séculos.

Outra questão interessante é a cabeleira. Na Epístola aos Coríntios, Paulo escreve que "é uma desonra para o homem ter cabelo comprido".

O que indica que o próprio Jesus não tivesse tido madeixas longas, como costuma ser retratado.

"Para o mundo romano, a aparência aceitável para um homem eram barbas feitas e cabelos curtos. Um filósofo da antiguidade provavelmente tinha cabelo curto e, talvez, deixasse a barba por fazer", afirma a historiadora Joan E. Taylor.


Ator Jim Caviezel interpretou Jesus no filme 'A Paixão de Cristo', de 2004, dirigido por Mel Gibson© ICON PRODUCTIONS/DIVULGAÇÃO

Chevitarese diz que as primeiras iconografias conhecidas de Jesus, que datam do século 3, traziam-no como um jovem imberbe e de cabelos curtos.

"Era muito mais a representação de um jovem filósofo, um professor, do que um deus barbudo", pontua ele.

"No centro da iconografia paleocristã, Cristo aparece sob diversas angulações: com o rosto barbado, como um filósofo ou mestre; ou imberbe, com o rosto apolíneo; com o pálio ou a túnica; com o semblante do deus Sol ou de humilde pastor", contextualiza a pesquisadora Wilma Steagall De Tommaso, professora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e do Museu de Arte Sacra de São Paulo e membro da Sociedade Brasileira de Teologia e Ciências da Religião.

Imagens

Joan acredita que as imagens que se consolidaram ao longo dos séculos sempre procuraram retratar o Cristo, ou seja, a figura divina, de filho de Deus — e não o Jesus humano.

"E esse é um assunto que sempre me fascinou. Eu queria ver Jesus claramente", diz.

A representação de Jesus barbudo e cabeludo surgiu na Idade Média, durante o auge do Império Bizantino. O professor Chevitarese diz que nesse período começaram a retratar a figura de Cristo como um ser invencível, semelhante fisicamente aos reis e imperadores da época.

"Ao longo da história, as representações artísticas de Jesus e de sua face raras vezes se preocuparam em apresentar o ser humano concreto que habitou a Palestina no início da era cristã", diz o sociólogo Francisco Borba Ribeiro Neto, coordenador do Núcleo Fé e Cultura da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).

"Nas Igrejas Católicas do Oriente, o ícone de Cristo deve seguir uma série de regras para que a imagem transmita essa outra percepção da realidade de Cristo. Por exemplo, a testa é alta, com rugas que normalmente se agrupam entre os olhos, sugerindo a sabedoria e a capacidade de ver além do mundo material, nas cenas com várias pessoas ele é sempre representado maior, indicando sua ascendência sobre o ser humano normal, e na cruz é representado vivo e na glória, indicando, desde aí, a sua ressurreição."


Joaquin Phoenix interpretou Jesus no filme 'Maria Madalena', de 2018© Divulgação

Como a Igreja ocidental não criou tais normas, os artistas que representaram Cristo ao longo dos séculos o criaram ao seu modo.

"Pode ser uma figura doce ou até fofa em muitas imagens barrocas ou um Cristo sofrido e martirizado como nas obras de Caravaggio ou Goya", pontua Ribeiro Neto.

"O problema da representação fiel ao personagem histórico é uma questão do nosso tempo, quando a reflexão crítica mostrou as formas de dominação cultural associadas às representações artísticas", prossegue o sociólogo.

"Nesse sentido, o problema não é termos um Cristo loiro de olhos azuis. É termos fiéis negros ou mulatos, com feições caboclas, imaginando que a divindade deve se apresentar com feições europeias porque essas representam aqueles que estão 'por cima' na escala social."

Essa distância entre o Jesus "europeu" e os novos fiéis de países distantes foi reduzida na busca por uma representação bem mais aproximada, um "Jesus étnico", segundo o historiador Chevitarese.

"Retratos de Jesus em Macau, antiga colônia portuguesa na China, mostram-no de olhos puxados, com a forma de se vestir própria de um chinês. Na Etiópia, há registros de um Jesus com feições negras."

No Brasil, o Jesus "europeu" convive hoje com imagens de um Cristo mais próximo dos fiéis, como nas obras de Cláudio Pastro (1948-2016), considerado o artista sacro mais importante do país desde Aleijadinho. Responsável por painéis, vitrais e pinturas do interior do Santuário Nacional de Aparecida, Pastro sempre pintou Cristo com rostos populares brasileiros.

O teólogo Francisco Catão, autor do livro Catecismo e Catequese, entre outros, defende que as feições de Jesus pouco importam para os religiosos.

"Nunca me ocupei diretamente da aparência física de Jesus. Na verdade, a fisionomia física de Jesus não tem tanta importância quanto o ar que transfigurava de seu olhar e gestos, irradiando a misericórdia de Deus, face humana do Espírito que o habitava em plenitude. Fisionomia bem conhecida do coração dos que nele creem", diz.

*Este texto foi publicado originalmente em 21 de março de 2018

História de Edison Veiga - De Bled (Eslovênia) para a BBC News Brasil








quarta-feira, 1 de maio de 2024

POLITICA, VERDADE, MENTIRA, OPINIÕES OU FATOS ?


A concepção de política que Hannah Arendt nos apresenta remete a um determinado contexto da Grécia; inspira-se na filosofia prática de Aristóteles e retém elementos da filosofia kantiana. 

Nao  não confunde o logos com a verdade nem com o lógico em sentido estrito, mas compreende-o como uma espécie de razão comum, partilhada pelos homens, através da palavra.

Este logos que perpassa os homens é o que funda a política e sua “posse” nunca representa uma rigidez absoluta, de caráter fundamental, tal qual aquela que caracterizaria a posse da verdade. Sua “posse”, ao contrário, depende do diálogo, no qual as opiniões se entrechocam e se elevam a um patamar de sabedoria prática assentada no consenso momentâneo. É  aquele conceito onde se permite aceitar quase tudo na política pois quase sempre os dias são voláteis como as criptomoedas.


Nesse sentido, o homem dotado de logos não é um ser privilegiado que deve governar, mas um cidadão cuja existência é compartilhada com todos os outros nesse espaço comum chamado pólis. 

Não há privilégio político, há a lei, porque a lei é concebida na partilha de valores aos quais todos se submetem livremente. Essa lei, por sua vez, depende da existência do indivíduo dotado de logos, porque só este é capaz de interpretá-la e adequá-la aos aspectos contingentes da vida prática.

A política é uma atividade relacionada ao âmbito da ação humana e não do pensamento puro. Não sendo da esfera do pensamento puro, sua condução depende mais do consenso de opiniões do que do encontro de uma verdade absoluta. Será que a politica não oferece a constante da verdade absoluta ? Esse paradoxo, aparentemente inofensivo, qual seja o entrechoque entre verdade e opinião em um terreno de ação humana, responde por critérios distintos de concepções do político, critérios esses que vão dos mais dogmáticos e autoritários aos mais relativistas e liberais.

E o político que vive na mentira real, criada por sua verdade absoluta imposta a ignorância  de indivíduos da massa.

A concepção kantiana de imaginação na Crítica da Faculdade de Julgar permitiu a Arendt adequar a linguagem filosófica ao âmbito político. A esfera da mentalidade alargada de que fala Kant seria a esfera de atuação do pensamento no âmbito prático político. Esse movimento interessa à reflexão hodierna porque traz o pluralismo como aspecto intrínseco dessa faculdade que atua entre os homens e suas opiniões. As opiniões fazem parte do entrechoque saudável de ideias que induzem ao progresso social e ao desenvolvimento intelectual da coletividade.

O problema advém quando a opinião, que deveria ser sustentada nos fatos, encontra-se viciada por considerar os próprios fatos como opiniões. É como se o pensamento político representativo e plural perdesse a sua base de apoio. Os fatos têm uma importância capital no desenrolar político porque versam sobre o passado e o presente, de cuja interpretação depende o futuro.

A discussão política baseada em opiniões tem o limite no indivíduo que as coloca, porém quando baseadas em fatos, sai do campo da opinião e penetra na seara da VERDADE.

O futuro de uma sociedade que se funda na deturpação dos fatos não se abre para o novo, para o verdadeiro porvir, mas estaciona, estagnado pela própria incapacidade de reflexão daqueles que ainda sequer estabeleceram a realidade sobre a qual precisam deliberar.

Não se pode, portanto, deixar de lado a problemática da verdade no âmbito político mesmo que se compreenda que a verdade, quando abordada dessa perspectiva, distancia-se ou transmuta-se em sua essência, o que equivale a dizer que não há verdade religiosa ou filosófica no âmbito político, mas há uma verdade própria a ser buscada em tal contexto.

A verdade a ser buscada na política é de dois tipos: a verdade factual e a verdade político-moral. A verdade factual é a matéria da opinião e a opinião adequada ou qualificada é a matéria da verdade política. A verdade política é a justiça, embora não se trate aqui da justiça transcendente, mas da justiça legal, desde que esse legal tenha sido formulado dentro do contexto do justo moral.

Fatos e eventos, que constituem a própria textura do domínio político, são, segundo Arendt, “entidades infinitamente mais frágeis que axiomas, descobertas e teoria ;isso se dá porque “ocorrem no campo das ocupações dos homens, em sempiterna mudança. Ao ocupar-se, porém, do antagonismo entre verdade e política, a tradição filosófica, de Platão a Hobbes, tratou da questão do erro, da ignorância, da ilusão e da opinião, mas não tratou da falsidade deliberada, da mentira vulgar, da mentira organizada que suprime ou deturpa os fatos e eventos.

O antagonismo da verdade, A MENTIRA vem dominando a política, com nova expressão,  A FAKE NEWS. Não esqueça,  a verdade está relacionada a FATOS. 

No mundo contemporâneo, o velho antagonismo entre a verdade do filósofo e a opinião comum ou entre a verdade religiosa revelada e as opiniões mundanas cedeu lugar ao conflito entre a verdade factual e a política. Nossa época tolera a diversidade de opinião em matéria religiosa e filosófica, mas “a verdade factual, se porventura opõe-se ao lucro ou ao prazer de um determinado grupo, é acolhida hoje em dia com mais hostilidade do que nunca.

As verdades incômodas ao poder até são toleradas nos países livres, mas ao preço de serem transformadas em opiniões. Esse esbatimento, porém, da linha de demarcação entre a verdade factual e a opinião equivale, segundo Arendt, a uma das numerosas formas que a mentira pode assumir.

Fato e opinião não se confundem nem se opõem, mas se complementam, porque pertencem ao mesmo domínio. O fato, uma vez estabelecido enquanto tal, está para além do acordo, do consentimento ou da discussão. O elemento distintivo da verdade factual é ter como o seu contrário não a ilusão ou a opinião, mas sim a mentira. A opinião requer a verdade factual como suporte e a própria “liberdade de opinião é uma farsa, a não ser que a informação factual seja garantida e que os próprios fatos não sejam questionados.

Alguém poderia levantar uma objeção perspectivista, do tipo inspirado na famosa frase de Nietzsche, “não existem fatos, apenas interpretações”, ou apontar as dificuldades inerentes ao trabalho do historiador que, para organizar os fatos, precisa fazer determinadas escolhas e optar por determinados métodos, o que já implicaria uma interpretação. Hannah Arendt não nega, porém, tais dificuldades, mas assevera que elas “não constituem argumento contra a existência de matéria factual, tampouco podem servir como uma justificação para apagar as linhas divisórias entre fato, opinião e interpretação ou como uma desculpa para o historiador manipular os fatos a seu bel-prazer.  A verdade factual não pode ser controlada, só pode ser descoberta. O controle da verdade factual ou o seu encobrimento é a manipulação ou a mentira.

A verdade factual é política por natureza,  enquanto a verdade filosófica é, por natureza, não política[9].

A única forma de a verdade filosófica entrar no âmbito político sem se tornar tirânica é através do exemplo. Ela precisa do exemplo como intermediário para adentrar o espaço entre os homens; ela requer que o próprio indivíduo que a proclama dê seu testemunho a fim de persuadir. No caso de Sócrates, por exemplo, sua sentença de que “é preferível sofrer o mal a praticá-lo” foi validada pela sua própria conduta ao recusar-se a fugir após proclamada sua sentença de morte.

A relação do filósofo com os fatos não é a mesma do cidadão. O cidadão precisa dos fatos para alcançar uma opinião e, a partir dessa opinião, posicionar-se diante da sua comunidade. O filósofo precisa dos fatos para alcançar uma verdade racional e, através desta, especular dentro do seu contexto e do seu linguajar específico. Importa, assim, desvencilhar a filosofia da política apenas no sentido de não confundir os graus de convencimento da verdade alcançada em cada âmbito. Se a política não resguardar o espaço da opinião, ela tenderá para a tirania, mas quando a opinião é formada sob fatos mentirosos o caos toma conta na confusão da massa.

O problema da mentira se impõe, portanto, mais como um problema político do que como um problema filosófico. A mentira não afeta muito o filósofo porque ele não é dado a agir, mas a pensar e a buscar verdades. O político e o cidadão, por outro lado, são instados a agir e precisam de elementos norteadores para suas ações. Esses elementos não podem ser persuasivos a ponto de coagirem, mas devem ser persuasivos a ponto de inclinarem. Esse grau de persuasão é obtido por intermédio da opinião qualificada e imparcial formada a partir da análise dos fatos.

O problema da mentira torna-se mais complexo na contemporaneidade devido, entre outros fatores, à possibilidade da manipulação em massa de fatos e opiniões. Tomando isso em consideração, Arendt analisará as diferenças entre a mentira política tradicional e a moderna mentira organizada. Enquanto a primeira incidia habitualmente sobre intenções ou sobre segredos que nunca tinham se tornado públicos, a segunda incide sobre coisas conhecidas praticamente de toda a gente. A mentira organizada é  crime.

Outra diferença importante é que a mentira tradicional implicava apenas particulares, dirigindo-se prioritariamente ao inimigo que pretendia enganar; os homens de estado ou diplomatas que se ocupavam da mentira conheciam e preservavam a verdade, sem se tornarem vítimas de suas próprias falsificações. As mentiras modernas, no entanto, envolvem toda a gente e costumam produzir o autoengano: elas “são tão grandes que requerem um completo rearranjo de toda a trama factual, a criação de outra realidade, por assim dizer, na qual se encaixem sem remendos, falhas ou rachaduras, exatamente como os fatos se encaixavam no seu próprio contexto original.

As reflexões acima elencadas acerca das relações entre política e verdade mostram que a relação é tensa, com tendência de desvantagem para a verdade quando em confronto com o poder. Não obstante, afirma Arendt, a verdade tem uma força própria adquirida do seu caráter insubstituível. De todo modo, é preciso atentar para os riscos existentes da extensão do domínio político para instâncias nas quais a importância política está justamente no caráter apolítico do exercício de suas funções.

O poder judiciário, por exemplo, assim como as instituições de ensino superior, são apontados como instituições públicas que, embora estabelecidas e apoiadas pelos poderes, precisam estar ciosamente protegidas do poderio social e político. A imprensa também precisaria “ser protegida do poder governamental e da pressão social com zelo ainda maior que o poder judiciário, pois a importantíssima função política de fornecer informações é exercida, em termos estritos, exteriormente ao domínio político.

A solidão do filósofo, o isolamento do sábio e do artista, a imparcialidade do historiador e do juiz, e a independência do descobridor de fato, da testemunha e do repórter são elencados por Arendt como modos de vida solitários que requerem o não-envolvimento e a imparcialidade, a libertação do interesse pessoal no pensamento e no juízo.

Quem busca a verdade está fadado à  solidão?

Diante do risco que o poder impõe à verdade, é indispensável que sejam resguardados do domínio político esses espaços e modos de vida onde a verdade é possível. Afinal, quando a comunidade está totalmente lançada na mentira, “a veracidade como tal, sem o apoio das forças distorcivas do poderio e do interesse, se torna fator político de primeira ordem. Onde todos mentem acerca de tudo que é importante, aquele que conta a verdade começou a agir.

A conclusão deste pensamento é simplesmente fatica: O IMPORTANTE É  QUE AQUELE QUE CONTA A VERDADE COMEÇA A AGIR.

SERGIO COUTO

Obs: Esse texto é baseado em pensamentos filosóficos 

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